Charles John Huffam Dickens nasceu em 07 de Fevereiro de 1812, na cidade de Moure, Condado de Hampshire - Inglaterra. Filho de John Dickens, funcionário perdulário da Armada e de Elizabeth Barrow, quando fez cinco anos, a família mudou-se para Chatham, no condado de Kent.
Mais tarde iria descrever a si mesmo, como uma criança não particularmente muito mimada. Ensinado por sua mãe, passava muito do seu tempo a ler infindavélmente – e, com especial devoção as novelas picarescas de Tobias Smollett e Henry Fielding. Entre os livros da sua infância encontravam-se também obras de Daniel Defoe, Goldsmith, bem como o "Dom Quixote", "Gil Blas" e "As Mil e uma noites". A sua memória fotográfica serviria, mais tarde, para conceber as suas personagens e enredos ficcionais, baseando-se muito nas pessoas e acontecimentos que foram marcando a sua vida.
A sua família era remediada em termos económicos, o que lhe permitiu frequentar uma escola particular durante três anos. A situação piorou, contudo, quando o seu pai foi preso por dívidas, depois de gastar os recursos da família no afã de manter uma posição social periclitante. Com dez anos de idade, a família mudou-se para o bairro popular de Camden Town em Londres, onde ocupavam quartos baratos e, para fazer face aos gastos, empenharam os talheres de prata e venderam a biblioteca familiar que tinha feito as delícias do jovem rapaz.
Com doze anos, Dickens já tinha a idade considerada necessária para trabalhar na empresa Warren’s onde se produzia graxa para os sapatos com betume, junto à actual Estação ferroviária de Charing Cross. O seu trabalho consistia em colar rótulos nos frascos de graxa, ganhando, por isso, seis xelins por semana. Com o dinheiro, sustentava a família, encarcerada na prisão para devedores, em Moure onde ia dormir.
Alguns anos depois, a situação financeira da família melhorou consideravelmente, graças a uma herança recebida pelo seu pai. A sua família deixou a prisão, mas a mãe não o retirou logo da fábrica, que pertencia a um amigo. Dickens jamais perdoaria a mãe por essa injustiça. O tema das más condições de trabalho da classe operária inglesa tornar-se-iam, mais tarde, um dos mais recorrentes da sua obra.
Carreira e fama
Dickens começou a trabalhar num escritório, emprego que poderia lhe render futuramente, a posição de advogado. Porém, não se adaptou ao trabalho. Após aprender taquigrafia, foi, por um curto período, estenógrafo do tribunal. Com dezoito anos de idade, começou outro período de leituras intensas, quando se inscreveu na biblioteca do British Museum. Por esta altura, apaixona-se pela filha de um banqueiro, Maria Beadnell. Os pais da menina desaprovaram, contudo, o idílio amoroso devido ao passado dos pais de Dickens.
Como Jornalista, foi cronista judicial, fazendo relatos dos debates parlamentares e cobrindo as campanhas eleitorais pela Grã-Bretanha. Os seus Sketches by Boz ("Esboços de Boz" - Boz era a alcunha do seu irmão mais novo que não era capaz de pronunciar devidamente "Moses" - Moisés, em inglês) são fruto desta época e são constituídos por pequenas peças jornalísticas em forma de retratos de costumes, originalmente escritas para o "Morning chronicle". Ao longo da sua carreira, Dickens continuou, durante muito tempo, a escrever para jornais.
Após os vinte anos de idade, o seu The Pickwick Papers (Os Documentos Póstumos do Clube Pickwick) estabeleceu o seu nome como escritor. A ideia inicial desta obra era que Dickens escrevesse comentários a ilustrações desportivas. De 1831 a 1834, a New Sporting Magazine comprovou o sucesso desta receita editorial com a sua série "Jorrock´s Jaunts and Jollities" sobre um comerciante cockney que quer a todo o custo ser reconhecido como o bom caçador que não era.
Querendo seguir a mesma ideia, Robert Seymour propôs aos editores Chapman and Hall criar uma série semelhante sobre um tal de "Clube Nimrod" (Nimrod é uma personagem bíblica descrita como sendo um grande caçador) onde também se troçaria dos caçadores inexperientes, mas cheios de si mesmos. Procuraram-se escritores para "complementar" as imagens com textos. A terceira opção, perante a recusa dos dois primeiros, era Dickens, que escrevera os seus Esboços para a mesma editora. Dickens rapidamente tomou conta do projecto e rejeitou a ideia de um clube de caçadores - a ideia não lhe agradava. Criou, pelo contrário, um clube de observadores de curiosidades, o que afastou definitivamente o ilustrador que tivera a ideia inicial, Seymour, que viria a suicidar-se na sequência destes acontecimentos.
Procurou-se outro ilustrador. É curioso que tenha sido rejeitado um tal de William Makepeace Thackeray que tornar-se-ia outro vulto de importância no romance vitoriano (geralmente colocado logo a seguir a Dickens, na opinião de muitos estudiosos da literatura inglesa - ou mesmo superior a Dickens, na opinião de outros). O novo ilustrador, conhecido pela alcunha de Phiz, deu conta do recado.
A 2 de Abril de 1836 (três dias depois da publicação do primeiro fascículo de "Pickwick"), casou-se com Catherine Hogarth, de quem teve dez filhos. A recepção do público a Pickwick não foi calorosa desde o início. Só quando aparece a personagem de Sam Weller, o criado de Pickwick e que acompanha as aventuras do seu amo ao jeito de um Sancho Pança ao lado de Dom Quixote, é que as vendas sobem de 400 exemplares para 40 000.
Em 1838, em decorrência do sucesso de Pickwick, propõe a publicação de "Oliver Twist" onde, pela primeira vez, apontava para os males sociais da era vitoriana. O romance, divulgado em folhetins semanais, terá também o seu ilustrador: Cruikshank.
Em 1842 viajou com a sua esposa para os Estados Unidos da América. A viagem foi descrita, depois, no curto relato de literatura de viagens American Notes, existindo também influências da mesma em alguns episódios de Martin Chuzzlewit. Ao entusiasmo com que foi recebido, de início, nos Estados Unidos, seguiu-se uma estadia menos calorosa, devido às críticas que teceu à política editorial deste país, acusando os editores de plágio em relação à literatura produzida na Grã-Bretanha.
Ilustração da primeira edição de "A Christmas Carol".
Em 1843, publicava o seu mais famoso livro de Natal, "A Christmas Carol" ("Canção de Natal"), ao qual se seguiriam outros, com a mesma temática, como "The Chimes" (1844), que escreveu em Génova na sua primeira grande viagem ao estrangeiro (se descontarmos a breve incursão aos Estados Unidos). Em 1845, "The Cricket on the Hearth" ("O Grilo da lareira") torna-se também um dos seus maiores sucessos natalícios.
Em 1848 publicava "Dombey and Son", escrito principalmente no estrangeiro, onde descreve o meio dos transportes ferroviários - outro tema estreitamente relacionado com a Revolução Industrial que conformava a sociedade vitoriana.
Em 1849 publicou aquele que viria a ser o mais popular dos seus romances, David Copperfield, onde se inspirava, em grande parte, na sua própria vida. As amizades literárias de Dickens incluíam, em 1854, Thomas Carlyle, a quem dedicará o seu romance "Tempos Difíceis".
A revista semanal Household Words, onde viria a publicar, em folhetins, alguns dos seus romances, foi fundada também por ele, em 1850. A revista seria reformulada em 1859, mudando de nome para "All the year round".
Os livros de Dickens tornaram-se extremamente populares na época e eram lidos com grande expectativa por um público muito fiel à sua escrita. O seu sucesso permitiu-lhe comprar Gad’s Hill Place, perto de Chatham, em 1856. Esta casa fazia parte do imaginário de Dickens, desde que por ela tinha passado, em criança – sonhando que um dia poderia lá viver. O local tinha ainda um significado especial porque algumas cenas do Henrique V de Shakespeare localizam-se nesta mesma área. Essa referência literária agradava de sobremodo a Dickens.
Seus últimos anos
Dickens separou-se da sua mulher em 1858. O divórcio era um acto altamente reprovável durante a era vitoriana, principalmente para alguém com a notoriedade dele. Continuou, contudo, a pagar-lhe casa e sustento durante os restantes anos em que ela viveu. Ainda que tivessem sido felizes no seu início de vida conjugal, Catherine parecia não partilhar a energia de viver sem limites de Dickens. O trabalho de cuidar dos dez filhos do casal, aliado à pressão resultante de ser a esposa e dona de casa de um romancista mundialmente reconhecido não ajudava.
A sua irmã, Georgina, tinha mudado para casa de Dickens, para ajudar Catherine no seu trabalho doméstico – há, contudo, rumores de que teve um caso amoroso com o cunhado. Georgina manteve-se com Dickens após a separação para cuidar dos filhos do casal. Podemos encontrar um indício da insatisfação marital de Charles num encontro que este teve em 1855 com Maria Beadnell, o seu primeiro amor.
A 9 de Junho de 1865, estando de regresso de França, onde fora visitar Ellen Ternan, Dickens viu-se envolvido no acidente ferroviário de Staplehurst, em que as seis primeiras carruagens do comboio caíram de uma ponte em reparação. A única carruagem de primeira classe que se manteve na linha foi, por coincidência, aquela onde seguia Dickens. O escritor mostrou-se ativo a cuidar dos feridos e moribundos antes de chegarem os esforços de salvamento. Quando se preparava para abandonar o lugar trágico lembrou-se, ainda a tempo, de que tinha deixado dentro do comboio o manuscrito inacabado do seu romance Our Mutual Friend (O nosso amigo comum) e voltou à carruagem para o buscar.
Dickens sofreu um acidente, já que se tornaria público que seguia viagem com Ellen Ternan e a sua mãe – o que seria escandaloso – até porque como tinha conhecido a actriz em 1857, a opinião púbica rapidamente a apontaria como a causa da separação de Catherine. Ellen foi, para todos os efeitos, a mulher que acompanhou Dickens até ao final dos seus dias, apesar de a união nunca ter sido reconhecida oficialmente.
Ainda que tivesse escapado ileso do acidente, nunca chegou a recuperar totalmente do choque. Isso é evidente no ritmo da sua produção que decresce bastante depois deste episódio. Levará algum tempo a completar Our Mutual Friend e a começar a sua obra incompleta, The Mystery of Edwin Drood, onde se notam influências de Wilkie Collins, que fazia parte do círculo de amigos de Dickens e que é considerado um dos pioneiros do romance policial. A partir de 1858, os seus últimos anos de vida serão ocupados principalmente com leituras públicas.
Esse gênero de espectáculos, que consistia apenas em ouvir Dickens a ler as suas suas obras mais conhecidas, tornaram-se incrivelmente populares. Note-se que na altura era comum ler em voz alta em família ou em grupos – a leitura expressiva era muito valorizada. E Dickens, com a sua interpretação apaixonada e a forma como se entregava à narração, não só arrebatava gargalhadas (e, principalmente, lágrimas) das audiências, como se arrebatava a si mesmo, exaurindo as suas forças. O esforço despendido nestes espectáculos é, muitas vezes, apontado como uma das causas da sua morte. Em 1867 foi convidado a voltar aos Estados Unidos para uma digressão das suas leituras.
- Charles Dickens morreu de morte cerebral em junho de 1870. Foi sepultado no Poets' Corner ("Esquina dos Poetas"), na Abadia de Westminster. Na sua sepultura está gravado: "Apoiante dos pobres, dos que sofrem e dos oprimidos; e com a sua morte, um dos maiores escritores de Inglaterra desaparecia para o mundo."
Na década de 1980, a histórica Eastgate House (casa Eastgate), em Rochester, em Kent, foi convertida num museu dedicado a Charles Dickens. Anualmente realiza-se na cidade o Festival Dickens. A casa onde nasceu, em Portsmouth é, atualmente, um museu.
Dickens teve dez filhos com Catherine Thompson Hogarth.
Popularidade
Sua popularidade continuou quase que inalterada após sua morte, continua sendo um dos autores ingleses mais lidos e apreciados. Pelo menos cerca de 180 filmes e adaptações para televisão das suas obras documentam ainda o seu sucesso entre o público atual. Já durante a sua vida se tinham adaptado algumas das suas obras para o palco. Em 1913 já os produtores cinematográficos se lançavam na produção de um filme mudo denominado The Pickwick Papers. As suas personagens eram de tal forma sugestivas que pareciam ganhar vida própria, tornando-se, mesmo, proverbiais. A língua inglesa ganhou alguns neologismos à sua conta. Gamp é um termo usado na gíria para "guarda-chuva", devido a uma personagem – Mrs Gamp. Pickwickiano, Pecksniffiano, etc., podem ser usadas para se referir ao mesmo tipo de pessoa que as personagens referidas.
Obras
Principais Romances
The Pickwick Papers (1836)
Oliver Twist (1837–1839)
Nicholas Nickleby (1838–1839)
The Old Curiosity Shop ("Loja de Antiguidades")(1840–1841)
Barnaby Rudge (1841)
Os Livros de Natal:
A Christmas Carol ("Canção de Natal" ou "Um conto de Natal") (1843)
The Chimes (1844)
The Cricket on the Hearth (1845)
The Battle for Life (1846)
Martin Chuzzlewit (1843-1844)
Dombey and Son (1846–1848)
David Copperfield (1849–1850)
Bleak House ("A Casa Abandonada", "Casa desolada" ou "Casa sombria") - (1852–1853)
Hard Times ("Tempos Difíceis") (1854)
Little Dorrit ("A pequena Dorrit") - (1855–1857)
A Tale of Two Cities ("Um conto de duas cidades") (July 11, 1859)
Great Expectations ("Grandes Esperanças") - (1860–1861)
Our Mutual Friend (1864–1865)
The Mystery of Edwin Drood (inacabado) (1870)
Contos
"A Christmas Tree";
"A Message from the Sea";
"Doctor Marigold";
"George Silverman’s Explanation";
"Going into Society";
"Holiday Romance";
"Hunted Down";
"Mrs. Lirriper’s Legacy";
"Mrs. Lirriper’s Lodgings";
"Mugby Junction";
"Perils of Certain English Prisoners";
"Somebody’s Luggage";
"Sunday Under Three Heads";
"The Child’s Story";
"The Haunted House";
"The Haunted Man and the Ghost’s Bargain";
"The Holly-Tree";
"The Lamplighter";
"The Seven Poor Travellers";
"The Trial for Murder";
"Tom Tiddler’s Ground";
"What Christmas Is As We Grow Older";
"Wreck of the Golden Mary";
Outros
Sketches by Boz (1836)
American Notes (1842)
A Child’s History of England (1851–1853)
(Introdução às obras de Dickens - por G. K. Chesterton)
Para receber atualizações das matérias:
Você receberá um e-mail de confirmação, é só seguir o link e confirmar.
Ir para Literatura