CIÊNCIA E ÉTICA - BIOLOGIA

Ética é uma palavra de origem grega, com duas origens possíveis. A primeira é a palavra grega éthos, com e curto, que pode ser traduzida por costume, a segunda também se escreve éthos, porém com e longo, que significa propriedade do caráter. A primeira é a que serviu de base para a tradução latina Moral, enquanto que a segunda é a que, de alguma forma, orienta a utilização atual que damos a palavra Ética. Ética é a investigação geral sobre aquilo que é bom.

A Ética tem por objetivo facilitar a realização das pessoas. Que o ser humano chegue a realizar-se a si mesmo como tal, isto é, como pessoa. A Ética se ocupa e pretende a perfeição do ser humano.

Os avanços, nas últimas décadas, da genética, da bioquímica e da microbiologia, ou seja, da biologia molecular, resultaram em uma nova tecnologia voltada para a solução de problemas em benefício da sociedade. A biotecnologia vem contribuindo significativamente em áreas necessárias à sobrevivência humana, como produção de alimentos, controle de pragas, sanidade animal, diagnóstico de doenças hereditárias ou não, produção de hormônios e, ainda em seu início, a terapia gênica.

De tempos em tempos, e cada vez mais freqüentemente, a divulgação de novos avanços científicos e tecnológicos nesta área causam impactos na opinião pública e reacendem a polêmica sobre as precauções que se fazem desejáveis no ordenamento e no balizamento dos limites que a sociedade deseja impor à capacidade humana em avançar no desconhecido e a velocidade com que se deve incorporar as novas técnicas daí resultantes. Especialmente na biotecnologia, que rompeu barreiras naturais da limitação entre espécies e possibilitou a manipulação de um patrimônio que se originou nos primórdios da vida em nosso planeta, incluindo-se neste a criação de seqüências genéticas que nunca existiram, ou pelo menos nunca foram detectadas nos seres que conhecemos. É este avançar no desconhecido que faz com que cientistas e não-cientistas sejam cautelosos nos passos a serem dados.

Novas tecnologias muitas vezes assustam aqueles que não acompanham seu contínuo crescimento e inovação, particularmente quando recebem informações pela mídia em momentos particulares, quando algo espetacular ou de conseqüências inesperadas é divulgado.

Este trabalho de pesquisa tem como objetivo trazer alguns dos aspectos mais relevantes sobre a questão da ética x ciência, e seus principais dilemas.

A ÉTICA E A RESPONSABILIZAÇÃO

Para Hegel, a eticidade pergunta pela "autodeterminação" da vontade. Pelos propósitos e intenções que movem o sujeito agente. A responsabilização, do ponto de vista subjetivo, portanto, exige a presença destas duas condições: o saber e o querer (o reconhecimento e a vontade). Na exteriorização a vontade reconhece como seu o que ela soube e quis fazer. Só um ato livre pode ser responsabilizado. É o direito de saber que cada indivíduo tem.

Se a preocupação principal de Kant é estabelecer o princípio supremo do agir, a de Hegel, na moralidade, é determinar as condições de responsabilidade subjetiva e, na eticidade, mostrar o desdobramento objetivo das vontades livres. O primeiro está mais preocupado com os princípios do agir; o segundo mais com os desdobramentos, circunstâncias e conseqüências do mesmo. As conseqüências e os resultados não são ignorados por Kant. O que não podem é servir de fundamento do princípio supremo da moralidade.

É claro que toda ação, ao concretizar-se, pode ter inúmeras conseqüências. Não se pode, portanto, ser responsabilizado por algo do qual não se tinha conhecimento. Só me pode ser imputado o que eu sabia acerca das circunstâncias de uma ação. No entanto, é preciso considerar que há conseqüências necessárias diretamente ligadas às ações e que nem sempre poder ser previstas. Um incêndio deliberado pode estender-se além do que o seu autor havia previsto.

Diferentemente de Kant, o qual elabora uma ética das intenções, Apel (Karl-Otto Apel) pensa uma ética da responsabilidade, isto é, uma ética que leva em conta as conseqüências e efeitos colaterais dos atos dos sujeitos agentes. O meio pelo qual se chega a normas consensuais na moral e no direito é o discurso argumentativo, exercido por todos os indivíduos. Isso os tornará co-responsáveis pelas conseqüências de suas ações.

Numa perspectiva hegeliana, a insuficiência de Kant está no fato de ele ter permanecido no plano da moralidade subjetiva, quando da fixação do princípio supremo do agir moral. É claro que Kant, ao enfatizar que o valor moral de uma ação está na intenção ou no respeito à lei, não está afirmando que os sujeitos agentes devem ignorar os resultados e as conseqüências. Está dizendo que elas não podem ser o fundamento determinante de uma ação que pretende ter valor moral. Não se pode julgar uma ação como boa ou má, certa ou errada, pensa o autor, pelo fato de nos agradarem ou não as conseqüências. O problema está em que o valor moral é tão-somente determinado pela subjetividade (propósitos e intenções). Kant dirá que o homem bom (moralmente bom) é aquele que obedece à lei pela lei, e não por causa das conseqüências.

O QUE É CIÊNCIA?

A ciência pode ser definida como um conjunto de conhecimentos sistematicamente organizados, com um objeto de estudo determinado. Este conhecimento, entretanto, não pode ser considerado como verdade absoluta. Podemos verificar, ao longo da história, que verdades científicas sofrem transformações, muitas vezes radicais em curto espaço de tempo.

Tanto a Ciência como a Tecnologia se modificam a partir de imposições da própria sociedade, estando intimamente relacionadas à transformação desta mesma sociedade.

A Ciência, enquanto tentativa de explicar a realidade, se caracteriza por ser uma atividade metódica.

A CIÊNCIA E A BIOÉTICA

A genética é uma ciência do século XX, as Leis de Mendel foram redescobertas e começaram a ser aplicadas em 1900. Nos primeiros três quartos deste século, a genética mendeliana contribuiu significativamente para a sustentação do crescimento populacional de nosso planeta, produzindo maiores safras de alimentos de origem vegetal, aumentando a produtividade dos animais domésticos e contribuindo para uma maior longevidade humana. Com a decifração do código genético e a manipulação do DNA neste último quarto de século, aceleraram-se as descobertas científicas e suas aplicações biotecnológicas. Abriram-se novas perspectivas econômicas nos campos da saúde humana, sanidade animal, produção de alimentos e novos termos e conceitos foram incorporados ao cotidiano como plantas e animais transgênicos, clonagem de mamíferos, produção de proteínas humanas em microrganismos, em plantas e em animais, mapeamento do genoma humano e terapia gênica.

Junto a tantas biotecnologias, surgem algumas que despertam, mesmo entre os pesquisadores de engenharia genética, dúvidas, discussões e preocupações de caráter especulativo sobre futuras aplicações que possam ferir os princípios éticos de nossa sociedade. Os efeitos sinergísticos de algumas técnicas biológicas, como a manipulação de DNA versus a produção de embriões humanos em laboratório, a clonagem com a tecnologia dos transplantes, a terapia gênica junto com a manipulação de células germinativas, a seleção de características genéticas (eugenia) nas primeiras divisões celulares no processamento da fecundação assistida, o diagnóstico precoce de doenças hereditárias tardias e cálculos atuariais nas empresas de seguro ou de emprego etc. estão atingindo uma sociedade despreparada para entender e mesmo normatizar o novo paradigma das inúmeras aplicações da biotecnologia e seus impactos no novo milênio que se aproxima. Por outro lado, as “banalizações” das técnicas da biologia moleculares e da manipulação e conservações de embriões ampliam as possibilidades da realização de experimentos em laboratórios pouco sofisticados e com baixos recursos financeiros.

As ovelhas Dolly e Polly são produtos da associação de um pequeno grupo de pesquisadores com uma pequena empresa biotecnológica. Mais recentemente foi amplamente divulgado pela imprensa o resultado de experimentos para a obtenção de girinos sem cabeça, desenvolvidos por Jonathan Slack, da Universidade de Bath, na Inglaterra. Imediatamente surgiram especulações de que esta seria uma nova técnica de obtenção de órgãos para transplante, a técnica seria aplicável em humanos, um feto humano sem cabeça e sem vida própria não seria considerado um novo ser, portanto não lhe seriam aplicadas as normas éticas ou legais vigentes. O girino alterado geneticamente foi eliminado no quinto dia de seu desenvolvimento para não ferir a legislação britânica de biossegurança e proteção de animais utilizados em experimentos. Um tecnicismo legal justificaria este tipo de experimento? Por outro lado, leis ou normas restritivas devem ou podem impedir o avanço do conhecimento?

Somente a ética e, no caso particular, a bioética darão respostas satisfatórias para a sociedade e para o indivíduo, dando-lhes o balizamento necessário para suas ações. A bioética, dentro da definição dada por W.T. Reich, na Encyclopedia of Bioethics (1978), tem como princípios básicos a Autonomia (respeito ao autogoverno), a Beneficência (atendimento aos interesses do indivíduo) e a Justiça (entendida como a eqüidade na distribuição dos bens e serviços). Para que a sociedade se manifeste eticamente sobre os novos tempos biotecnológicos deste novo milênio que se aproxima, faz-se necessário o apoio a estes estudos.

DILEMAS ÉTICOS E A CIÊNCIA

A seguir serão apresentados alguns dos dilemas éticos enfrentados pelos profissionais da medicina:

O Aborto

Atualmente, no Brasil, o aborto é considerado crime, exceto em duas situações: de estupro e de risco de vida materno. A proposta de um Anteprojeto de Lei, que está tramitando no Congresso Nacional, alterando o Código Penal, inclui uma terceira possibilidade quando da constatação anomalias fetais.

Esta situação já vem sendo considerada pela Justiça brasileira, apesar de não estar ainda legislada. Desde 1993, foram concedidos mais de 350 alvarás para realização de aborto em crianças mal formadas, especialmente anencéfalos. Os juízes inicialmente solicitavam que o médico fornecesse um atestado com o diagnóstico da má formação, além de outros três laudos para confirmação, um outro laudo psiquiátrico sobre o risco potencial da continuidade da gestação e um para a cirurgia. Ao longo deste período estas exigências foram sendo abrandadas.Em algumas solicitações os juízes não aceitaram a justificativa, e não concederam o alvará tendo em vista a falta de amparo legal para a medida. Em 2000 um advogado entrou com uma solicitação de medida liminar para impedir uma autorização de aborto de bebe anencéfalo no Rio de Janeiro. A mesma foi concedida.

Este tema tem sido discutido desde inúmeras perspectivas, variando desde a sua condenação até a sua liberação inclusive descaracterizando-o como aborto, mas denominando o procedimento de antecipação terapêutica de parto.

O suicídio assistido

O suicídio assistido ocorre quando uma pessoa, que não consegue concretizar sozinha sua intenção de morrer, e solicita o auxílio de um outro indivíduo.

A assistência ao suicídio de outra pessoa pode ser feita por atos (prescrição de doses altas de medicação e indicação de uso) ou, de forma mais passiva, através de persuasão ou de encorajamento. Em ambas as formas, a pessoa que contribui para a ocorrência da morte da outra, compactua com a intenção de morrer através da utilização de um agente causal.

O suicídio assistido ganhou notoriedade através do Dr. Jack Kevorkian, que nos Estados Unidos, já o praticou várias vezes em diferentes pontos do país, por solicitação de pacientes de diferentes patologias.

Existe uma instituição, denominada de Hemlock Society (ou Sociedade Cicuta), numa clara alusão ao suicídio de Sócrates. Esta Sociedade publicou, em 1991, um livro, A Solução Final, que apresentava inúmeras maneiras de um paciente terminal ou com doenças degenerativas cometer suicídio. Este livro vendeu mais de 3 milhões de cópias nos Estados Unidos. No Brasil, onde foi também traduzido, não causou maior impacto.

Por outro lado, associações como Not Dead Yet (ainda não mortos), de pessoas portadoras de deficiencias físicas, caracterizam esta possibilidade como sendo um padrão duplo (duplo standard) que os discrimina frente ao restante da sociedade.

Em 08 de janeiro de 1997 a Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos, julgando o caso Quill, declarou não haver diferenças morais ou legais entre não implantar ou retirar um tratamento e auxiliar um paciente a suicidar-se. Posteriormente, em 26 de junho de 1997, a Suprema Corte Norte Americana alterou este raciocínio, voltando a admitir que existem diferenças marcantes entre estes procedimentos.

Ramon SanPedro, um espanhol tetraplégico que havia solicitado na Justiça várias vezes que lhe fosse permitida a eutanásia, acabou morrendo após 29 anos de solicitações, através de um suicídio assistido. Este ato final foi gravado em vídeo como forma de documentar a sua ação pessoal na administração da medicação em dose letal.

Desde 1997 o estado norte-americano de Oregon tem uma Lei vigente que possibilita aos seus residentes solicitarem o auxílio para se suicidarem. No ano de 1999, foram registrados oficialmente 33 casos de suicídio assistido.

A Suíça também permite a realização do suicídio assistido, inclusive podendo ser realizado sem a participação de um médico e o a pessoa que deseja morrer não necessita estar em fase terminal. A base legal é o Código Penal de 1918, que afirma que o suicídio não é crime. O único impedimento é quando o motivo for egoísta, por parte de quem auxilia. A Eutanásia não está prevista na legislação suíça.

Transfusão de sangue e religião

Alegar um impedimento religioso para a realização de um ato médico é bastante mais freqüente do que se imagina. Muitas vezes os pacientes ou seus familiares ficam constrangidos de utilizarem um referencial religioso para orientar a sua tomada de decisão. Algumas denominações religiosas, como, por exemplo, Ciência Cristã e Testemunhas de Jeová, são conhecidas por seus seguidores imporem restrições desta ordem a algumas formas de tratamento.

A questão que envolve a indicação médica de transfusão de sangue em pacientes Testemunha de Jeová é das mais polêmicas e conhecidas. Esta situação envolve um confronto entre um dado objetivo com uma crença, entre um benefício médico e o exercício da autonomia do paciente.

A base religiosa que os Testemunhas de Jeová alegam para não permitirem ser transfundidos é obtida em alguns textos contidos na Bíblia.

No livro de Gênesis (9:3-4) está escrito:

"Todo animal movente que está vivo pode servir-vos de alimento. Como no caso da vegetação verde, deveras vos dou tudo. Somente a carne com sua alma - seu sangue - não deveis comer."

Levítico (17:10), outra restrição semelhante:

"Quanto qualquer homem da casa de Israel ou algum residente forasteiro que reside no vosso meio, que comer qualquer espécie de sangue, eu certamente porei minha face contra a alma que comer o sangue, e deveras o deceparei dentre seu povo.”

Atos dos Apóstolos (15:19-21).

Já existe uma farta bibliografia a respeito desta questão. A maioria divide-a em duas abordagens básicas: o paciente capaz de decidir moral e legalmente e o paciente incapaz.

O paciente reconhecidamente capaz deve poder exercer a sua autonomia plenamente. Este posicionamento foi utilizado pelo Prof. Diego Gracia, da Universidade Complutense de Madrid/Espanha. O Prof. Gracia utiliza esta situação como paradigmática no exercício da autonomia do indivíduo frente a pressões sociais. O Prof. Dunn ressalta que esta é uma posição corajosa, mesmo que questionável por outras pessoas que não compartilham desta crença.

Para alguns autores, como Genival Veloso de França este posicionamento só é válido enquanto não houver risco de morte iminente associado ao estado do paciente. Nesta situação o médico estaria autorizado a transfundir o paciente, mesmo contra a sua vontade, com base no princípio da Beneficência. O argumento utilizado é o de que a vida é um bem maior, tornando a realização do ato médico um dever prima facie, sobrepujando-se ao anterior que era o de respeitar a autonomia. Este posicionamento tem respaldo, inclusive no Código de Ética Médica.

A restrição à realização de transfusões de sangue pode gerar no médico uma dificuldade em manter o vínculo adequado com o seu paciente. Ambos tem diferentes perspectivas sobre qual a melhor decisão a ser tomada, caracterizando um conflito entre a autonomia do médico e a do paciente. Uma possível alternativa de resolução deste conflito moral é a de transferir o cuidado do paciente para um médico que respeite esta restrição de procedimento.

Os seguidores desta denominação religiosa - Testemunhas de Jeová - estão muito bem organizados para auxiliarem as equipes de saúde no processo de tomada de decisão. Existem Comissões de Ligação com Hospitais, que são constituídas por pessoas que se dispõem a ir ao hospital prestar assessoria visando o melhor encaminhamento possível ao caso. A Comissão de Ligação de Hospitais dispõe de um cadastro de médicos que pode ser útil em tais situações.

Estes são apenas alguns dos dilemas éticos dos que praticam a ciência, e que estão longe de ter pontos pacíficos.

ASPECTOS BIOLÓGICOS DA CLONAGEM

A palavra clone, para identificar indivíduos idênticos geneticamente foi introduzida na língua inglesa no início do século XX. A sua origem etimológica é da palavra grega klon, que quer dizer broto de um vegetal.

A clonagem é uma forma de reprodução assexuada que existe naturalmente em organismos unicelulares e em plantas. Este processo reprodutivo se baseia apenas em um único patrimônio genético. Nos animais ocorre naturalmente quando surgem gêmeos univitelinos. Neste caso ambos novos indivíduos gerados tem o mesmo patrimônio genético. A geração de um novo animal a partir de um outro pré-existente ocorre apenas artificialmente em laboratório Os indivíduos resultantes deste processo terão as mesmas características genéticas cromossômicas do indivíduo doador, ou também denominado de original.

A clonagem em laboratório pode ser feita, basicamente, de duas formas: separando-se as células de um embrião em seu estágio inicial de multiplicação celular, ou pela substituição do núcleo de um óvulo por outro proveniente de uma célula de um indivíduo já existente.

Para muitos cientistas a clonagem de seres humanos ainda não é possível, embora em 1979 um pesquisador norte-americano, L.B. Shettles, da Universidade de Colúmbia/EUA, tenha publicado uma comunicação sobre uma substituição de núcleo de um ovócito humano com sucesso. Este pesquisador utilizou uma espermatogônia humana. A publicação incluía fotos que demonstravam que o autor levou o processo até a forma de mórula. Este artigo é a primeira publicação na história sobre a clonagem humana.

A questão ética em torno dos clones humanos retornou com a entrevista do físico Richard Seed (Chicago/EUA), feita através da imprensa internacional, no início de 1998. Este físico, sem vínculo acadêmico e que já realizou pesquisas em biologia, afirmou que poderia produzir clones humanos até a metade do ano de 1999. Chegou a estimar poderia produzir até 500 destes indivíduos por ano. Suas colocações reacenderam as discussões a este respeito em várias partes do mundo (Estados Unidos, Austrália, Europa).

A Dra. Brigitte Boisselier anunciou no dia 27 de dezembro de 2002 que havia nascido o primeiro bebe humano clonado. Este bebe, uma menina, que recebeu o nome de Eve, nasceu com cerca de 3 Kg de peso em um local não informado. Os seus pais contrataram a CLONAID, dirigida pela Dra. Boisselier, para gerarem um filho, pois o pai era infértil. A mãe, cuja células da pele foram utilizadas para produzir o clone, tem 31 anos. A CLONAID, que é vinculada ao Movimento Raeliana, contratou o jornalista Michael Guillen, que foi o editor científico da rede norte-americana ABC, para atestar a veracidade do clone produzido.

Houve a denúncia de que este jornalista teria oferecido a exclusividade da divulgação a inúmeros órgãos de imprensa. Devido a falta de provas e de credibilidade não houve a compra dos direitos. Com a entrada da Justiça Norte-Americana no caso houve uma retração dos autores e não foram feitos quaisquer testes que atestassem a veracidade deste episódio nem a apresentação do próprio bebe. A CLONAID anunciou que outros bebês clonados estão para nascer em diferentes países do mundo.

ASPECTOS ÉTICOS NA CLONAGEM

A preocupação com a abordagem das questões éticas dos processos de clonagem não é recente. Desde a década de 1970 vários autores tem discutido diferentes questionamentos a respeito dos aspectos éticos envolvidos. Paul Ramsey, em 1970, propôs a importante discussão sobre a questão da possibilidade da clonagem substituir a reprodução pela duplicação. Esta possibilidade reduziria a diversidade entre os indivíduos, com o objetivo de selecionar características específicas de indivíduos já existentes. Isto teria como conseqüência a perda da individualidade, com a possível despersonalização destas pessoas.

Em 1970 Alvin Toffler, em seu livro Choque do Futuro, já abordou a questão da clonagem. Foi um dos textos precursores sobre este tema. Em duas páginas Toffler fez algumas considerações do impacto futuro deste processo reprodutivo. A sua previsão era de que a clonagem de seres humanos já seria possível em 1985.

O experimento realizado na Escócia (ovelha Dolly) despertou novamente o debate sobre a adequação da pesquisa em genética. Muitas fantasias cercam o tema da produção de clones, valorizando apenas as características genéticas contidas no núcleo substituído, desqualificando a influência dos fatores histórico-ambientais e de herança genética citoplasmática (mitocôndrias). O portavoz da Human Cloning Foundation, dos Estados Unidos, Randolfe Wicker, por exemplo, difunde a idéia de que a clonagem é sinônimo de imortalidade, pois acredita que o novo ser clonado é o mesmo que o que o originou. Assim, morrendo o ser original a cópia sobreviveria mantendo viva a pessoa. Esta é uma visão totalmente equivocada do processo de clonagem, pois ela nada mais é uma forma de reprodução assexuada, desta forma o novo organismo é uma nova pessoa e não um anexo da que o originou, a exemplo dos pais e filhos na reprodução sexuada convencional.

Nos Estados Unidos, os estados da Califórnia, Louisiana, Michigan, Rhode Island e Texas tem leis que proíbem a clonagem em seus territórios. No Brasil, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, talvez extrapolando a sua competência legal, baixou uma Instrução Normativa 08/97, de 9 de julho de 1997, proibindo a manipulação genética de células germinativas ou totipotentes humanas, assim como os experimentos de clonagem em seres humanos. Vale ressaltar que já tramitaram quatro projetos de lei no Congresso Nacional sobre a questão da clonagem de seres humanos. Todos estes projetos proibiam este procedimento, baseando-se principalmente em aspectos religiosos ou de temor frente a este tipo de procedimento.

O Prof. Joaquim Clotet, em 1997, referindo-se a questão da proibição da clonagem, afirmou: "a pesquisa não deve ser banida, apenas deve ser orientada para o bem geral da humanidade". Esta é a posição que reconhece que este conhecimento é um "conhecimento perigoso", mas não um conhecimento que deva ser banido. O que deve ser reforçado é a noção de que a clonagem é um procedimento que tem riscos associados. A questão da clonagem é um excelente exemplo de aplicação para o Princípio da Precaução, tão atual, mas pouco discutido na Bioética.

A QUESTÃO DOS ALIMENTOS TRANSGÊNICOS

Uma das questões que mais polêmica tem levantado ultimamente é a questão dos alimentos transgênicos (geneticamente modificados). Os países que aprovam a utilização são os mesmos que aceitam moralmente os alimentos transgênicos. Os que negam a sua utilização são os que reprovam moralmente. A questão do conhecimento e relevância é secundária. O reconhecimento de riscos e especialmente de benefícios é um fator importante na tomada de opinião a este respeito.

Algumas questões pendentes:

na área da saúde:

- toxicidade em grande populações e a dificuldade de execução de estudos de monitoramento;

- alergenicidade, que não será resolvida pela simples rotulagem;

na área ecológica:

- hibridação de espécies nativas com plantas transgênicas, repassando a característica para uma outra espécie, ao acaso. O principal risco envolvido é a transmissão de resistência a substâncias químicas, tipo herbicidas, podendo gerar nova pragas resistentes;

na área econômica:

- dependência dos produtores, e por conseqüência, da própria sociedade, de um pequeno número de empresas que produzem sementes patenteadas, com replantio impedido por contrato ou por geração de pagamento de royalties.

Enfim, o que fica como certo nesta questão é que a cautela e a busca por uma solução sejam compartilhadas por toda a sociedade e não de cima para baixo como costumam ser a solução de polêmicas como esta.

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